A banda carioca PELVs acaba de lançar a coletânea “Caixa 1991-2012”, dividida em 4 volumes, contendo sobras de estúdio, demos, lados B e raridades. Seria mais um caixa comemorativa nos modelos tradicionais da indústria fonográfica (no caso deles, do circuito nacional independente), não fosse por um detalhe: não existe caixa física. O lançamento é virtual e está disponível para download no site da banda.
A caixa virtual da PELVs nos remete ao conceito de remediação proposto por Bolter e Grusin (2000), que enfatiza a relação de apropriação entre diferentes mídias. Segundo os autores, a mídia digital funciona “em uma dialética constante com as mídias anteriores, da mesma forma que cada mídia anterior funcionou quando foi introduzida” (p. 50). Logo, uma das características das novas mídias seria a de lembrar alguns aspectos das anteriores. Por exemplo, a “tela” de vídeos do Youtube lembra a de uma TV, com seus botões de “play” e “volume”.
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Na música, muitos dos lançamentos digitais que temos acompanhado carregam tal característica de remediação, simulando CDs ou LPs, com suas capas, encartes, e algumas vezes, até lado A e lado B, tratando-se “de uma forma ativa de se relacionar com a história da música, quando o passado ressignifica o presente, enriquecendo-o de sentidos ao permitir o aprofundamento de uma genealogia musical que interessa ao ouvinte resgatar” (SÁ, 2009, p. 67).
A caixa virtual da PELVs lembra também o status material que conferimos ao MP3. No artigo “O MP3 como artefato cultural” (2010), Jonathan Sterne explica que, ao tratarmos do MP3, falamos com frequência de “coleções de MP3 analogamente a coleções de discos ou livros” (p. 71). Logo, colecionar MP3 sugere que eles são tomados como objetos culturais, mesmo que não sejam objetos físicos que possam ser segurados e manuseados. Coleções de MP3 (discografias completas de determinados artistas, por exemplo) não possuem as mesmas características materiais de coleções de CDs ou de LPs.

http://pelvsmusic.bandcamp.com/album/1991-2012-caixa-vol-1

Ouça: PELVs – Tonight is what it means to be young
A “Caixa 1991 – 2012” está disponível no site da PELVs, que direciona o link do download para o Bandcamp, plataforma muito utilizada recentemente para lançamentos de discos virtuais. Lá, é possível escolher a forma de contribuição (inclusive digitando 0 – ou seja, grátis) e baixar os quatro volumes separadamente. Cada caixa virtual vem com cerca de 15 ou mais arquivos de música e seus encartes com as respectivas datas e detalhes de gravação das faixas.
A PELVs é uma banda carioca de rock independente com letras em inglês que desde os anos 90 lança discos. Seu primeiro, Peter Greenaway´s Surf, foi lançado pelo selo independente “Rock It”, de Dado Villa-Lobos em 1993 e completa 20 anos, daí o motivo da caixa comemorativa. Os álbuns seguintes saíram pelo selo carioca Midsummer Madness, de Rodrigo Lariú. Na página oficial da banda  ou no selo Midsummer Madness, pode-se ouvir e baixar muitos álbuns, EPs e singles em MP3 da PELVs. A banda circula pela cena de rock nacional descrita por Danilo Fraga (2007) como “outsider”, que utilizava
“o inglês como língua principal para as letras, a adoção de uma dicção típica dos grupos internacionais de rock and roll e distante da música popular brasileira, a utilização de equalizações que colocam a voz em segundo plano, o desinteresse por qualquer tentativa de diálogo com a música popular brasileira, a adoção de suportes de armazenamento não-oficiais e a circulação em locais e meios especializados. Esses grupos eram distribuídos, principalmente, a partir de fitas cassetes com gravações caseiras ou, eventualmente, por lançamentos em disco por selos especializados” (p. 6).
Segundo Fraga, seria uma cena importante para o circuito da música atual, já que foram eles que esboçaram o inicio de um circuito de rock independente no Brasil, “que só seria completamente desenvolvido na primeira década do século 00” (idem).

http://pelvsmusic.bandcamp.com/album/1991-2012-caixa-vol-3

“Move on fast” é uma versão da PELVs para uma canção da artista Yoko Ono.
A caixa comemorativa da PELVs traz 68 músicas remasterizadas, entre demos, raridades, versões para artistas como Yoko Ono, Primal Scream, The The e Second Come, e versões acústicas e ao vivo. As faixas estão divididas em 4 volumes, simulando 4 CDs, e podem ser baixadas gratuitamente com alta qualidade. A Caixa 1991 – 2012 é um lançamento apenas no formato digital, sem previsão de versão física.
Para marcar os 20 anos do album Peter Greenaway’s Surf, a PELVs pretende fazer uma série de shows começando por Rio de Janeiro e São Paulo, e tocar o disco na íntegra. O repertório será incrementado por faixas da Caixa e deve contar com a participação especial de todos os músicos que já passaram pela banda. As datas serão divulgadas posteriormente.

Referências:
BOLTER, J., D.GRUSIN, R.. Remediation: understanding new media. Cambridge:MIT Press, 2000.
FRAGA, Danilo. O beat e o bit do rock brasileiro: internet, indústria fonográfica e a formação de um circuito médio para o rock no Brasil. 2007.
SÁ, Simone P. de. O CD morreu? Viva o vinil! In: O futuro da música depois da morte do CD. Irineu Franco Perpetuo; Sergio Amadeu da Silveira (orgs.). São Paulo: Momento Editorial, 2009.
Sterne, Johnatan. O MP3 como artefato cultural. In: Rumos e Cultura da Música: Negócios, estéticas, linguagens e audibilidades. Simone Pereira de Sá, 2010.

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